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Normal ou cesárea? Parto.

Desde que comecei a idealizar este blog, sabia de um dos temas que prometiam ser dos mais difíceis de escrever: o parto.

Não pelo simples fato de que esse segue sendo um tema mais que “tabu” pra todos nós, mas também porque desde os primeiros dias pós descobrimento da (p)maternidade mergulhamos em um mundo totalmente novo.

Normal, natural, vaginal, humanizado, cesárea, doula, parturiente, plano de parto, banheira, períneo, luz baixa, massagem, obstetrícia, anestesia, colírio, episiotomia, aspiração, dilatação, cordão, amamentação, vitamina K, fórceps, ocitocina, indução ao parto, centro cirúrgico.

Aqui divido com vocês uma pequena parte de um glossário infinito de situações e termos que inundam a justíssima discussão sobre o panorama atual da maternidade/gestação brasileira. E a sua vida.

Pense você, homem ou mulher, por mais distante que esteja da realidade de ser pai/mãe, nas prováveis poucas vezes que você falou sobre parto na sua vida. Arrisco dizer que na grande maioria a palavra “dor” estava no meio da mesma frase. “Parto normal” e “dor” viram sinônimos em uma situação como essa. E esse é um dos pontos que começam a justificar o motivo de nos depararmos com números que beiram o absurdo como:

55% dos partos no Brasil ocorrem por meio de cesárea. Agora tirem da conta a rede pública de saúde e cheguem a índices de quase 90% em maternidades da rede privada! Convenhamos, não preciso ser nenhum Drauzio Varela do parto natural pra achar esses números um tanto quanto abusivos (para efeito de comparação, no outro extremo da lista temos países como a Holanda com aproximadamente 10%).

Partimos do princípio que a cesárea é um procedimento cirúrgico criado graças à evolução da medicina e que já salvou milhões de vidas de mães e filhos(as) em situações de risco, não é mesmo? Óbvio que é! Ótimo, continuemos evoluindo e melhorando nossa medicina. Mas por outro lado, em que momento decidimos que o parto normal, que de fato segue o processo mais próximo à nossa natureza, virou uma opção pior ou que não valha a pena? Considerar um número de quase 90% é começar a se perguntar em que momento a cesárea deixou de ser um recurso para salvar vidas e passou a ser uma quase regra.

Às vezes quando paro pra pensar vejo que as gerações estão cada vez mais se acostumando com o mais fácil. “Pra que sentir dor?”, escutamos tanto. E eu confesso: sempre concordei. “Pra que sentir dor, se hoje temos uma medicina tão evoluída que pode nos poupar desse sofrimento?” Pois é, pensei muito nisso mas precisei estar aqui, quase pai e hoje interessado no assunto, pra poder entender um pouco mais e poder discutir os diferentes lados dessa história.

Mas honestamente, acho que o ponto que devemos discutir vem muito antes. Como uma menina que cresceu achando que o primeiro sinônimo da palavra “parto” é “dor” pode querer viver esse momento? Estamos pedindo demais... E no fundo esse é só mais um dos casos da nossa sociedade que se explica com uma palavra que já virou clichê: indústria.

O resumo para esses números é que esse é um negócio que não para e que envolve muitos interessados. Equipe, estrutura, hospital, medicamentos, agendas. A roda tem que girar, e quanto maior a eficiência melhor. Nessa entrevista* do obstetra Carlos Eduardo Czeresnia, do hospital Albert Einstein, para a Super Interessante, ele elenca fatores importantes justificando o “ouro” do Brasil nesse ranking. Da indicação cirúrgica do médico com medo de processos até o simples e prático fato de que é mais fácil agendar uma cirurgia de uma hora do que arriscar perder dias de consultas esperando longos trabalhos de parto. Essa conta vai ficando cara, e alguém tem que pagar.

E aqui entra o meu lado “advogado do diabo” tentando olhar o outro extremo também. Me explico: a partir do momento que começamos a entender um pouco mais do assunto e passamos a buscar outras alternativas, fomos conhecendo esse mundo naturalista. E adivinhem o que achamos? Outra indústria. Um mundo pequeno e fechado, onde as equipes de profissionais são quase sempre as mesmas, e ai de você se tentar mudar isso. Seu médico não é reconhecidamente um “médico naturalista”, mas já te conhece faz tempo e topou essa ideia com você? Muito legal, mas não vá achando que vai ser fácil. Se quiser chamar uma doula pra te acompanhar no processo ou escolher um pediatra neonatal naturalista, é bem possível (ou melhor, provável) que eles não topem trabalhar com seu médico simplesmente porque ele não faz parte da turma.

Agora complicou, hein? Se em algum momento pareceu que eu virei o maior naturalista do Brasil, afirmo que estou longe disso. Ainda estou tentando encontrar o lugar dos “meios-termos” nessa história toda, e acredite: não é fácil!

Topei a aventura de acompanhar a Ana Julia no caminho que ela escolheu. Admito que na prática vários momentos são mais delicados do que parecem. É um mundo novo, pra mim e pra ela. “Quero ter um parto mais natural possível”. Legal, você já imagina ela urrando e o bebê nascendo na sua mão no sofá da sala. “Mas no hospital, né?”, respondi esperançoso. Ela confirmou e percebi que estávamos falando a mesma língua.

Acho lindo ver casais tendo seus filhos em casa. Deve ser uma emoção incrível mesmo. Mas no momento confesso que sou dos mais “conservadores”. Bato no peito pela ideia do “mais natural possível”, mas no hospital, sem extremismos, respeitando a cada minuto a vontade, o bem-estar e a saúde de quem está ali protagonizando esse lindo momento.

Se ela me falasse que preferia uma cesárea, eu teria mergulhado junto também. Talvez incentivado que ainda assim a gente conhecesse um pouco desse mundo, pra realmente pensar nos prós e contras. E é essa minha posição pra qualquer outra mulher: não tem nenhum problema você optar por fazer uma cesárea. Se mesmo conhecendo as duas opções, você prefere e se sente mais confortável em ter o seu filho assim, a escolha é sua. E ninguém pode julgar essa decisão.

E o outro conselho que me parece cada vez mais importante é: caso você tenha optado por ter um parto natural, por mais convencida que você esteja, tenha consciência de que, no final, tudo pode acontecer. Pode ser que na hora o melhor caminho realmente seja fazer uma cesárea. Por essa ou aquela razão, pode ser que seu médico tenha que decidir. E essa notícia geralmente não vem fácil: imagine uma mulher que passou meses estudando, conhecendo, decidindo e defendendo essa causa. Que passou muitas horas em trabalho de parto. E que no final, por alguma complicação, acaba tendo que passar por uma cesárea?

Não tem nenhum problema.

Me assustei quando comecei a ler sobre o assunto e vi que depressão pós-parto era absurdamente mais normal do que eu imaginava. Claro que existem mil motivos, mas esse é um dos exemplos de situação que com certeza pode ajudar a agravar. A gestação é um período de inundação de expectativas e incertezas. E nos agarramos tão forte a algumas coisas, que quando algo sai diferente a frustração pode ser avassaladora. Mas convenhamos, tentando ser o mais racional e imparcial possível: quer momento mais mágico que o nascimento do seu filho? Não há. Não importa se foi na sala, na piscina, no hospital, com ou sem anestesia. Cada dia de gestação que você vive é por aquele momento, ou seja, não podemos deixar que no final algo que não foi como o esperado possa estragar tudo o que fizemos.

Não quero parecer o entendido no assunto, ou alguém que quer julgar qualquer que seja sua escolha. Reforço o que já destaquei aqui: sou só um quase-pai, leigo e que aos poucos vem conhecendo e debatendo o assunto. Esse texto não é para nenhum defendendor de causas e extremos. Mas sim para quem, assim como a gente, mergulhou de cabeça nesse universo pela primeira vez e só quer achar o seu pedaço no meio de tudo isso. Um pedaço nem muito cá nem muito lá, sem radicalismos, mas com espaço pra quem acredita que o momento do parto pode ser ainda mais bonito assim.

E será.

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